quinta-feira, 10 de março de 2011

As propostas da Carta de CLAUDIA (revista) para a presidenta Dilma Rousseff (muito bom, ver site)



Salários e oportunidades

Conquistar a autonomia financeira é um dos grandes desafios das brasileiras. Somos 38,8 milhões de mulheres no trabalho (48,83% da população ocupada), num ciclo crescente de acesso ao mercado.Mas ainda não nos veem como cidadãs plenas; ganhamos menos que os homens.Uma das razões históricas: para
equilibrar a dupla jornada, um maior contingente feminino se concentrou em nichos menos valorizados, que exigiam menor carga horária e ofereciam remuneração inferior.Ainda hoje,em funções equivalentes,o contracheque feminino segue menor que o masculino. Esse é um dos aspectos que impedem o Brasil de avançar no ranking Desigualdade Global de Gênero (DGG), do Fórum Econômico Mundial, que analisa o desempenho de 134 países em relação às desigualdades de gênero. No DGG de 2010, o Brasil ocupa o 85o lugar da classificação geral – despencou quatro posições em relação a 2009. Considerando apenas a questão salarial, ficamos na 123o colocação. No Brasil a renda feminina representa 70% da masculina, ou seja, enquanto o salário da mulher é de 861 reais,em média,o do homem é de 1 218 reais.A negra recebe cerca de 50% do holerite da branca.Mesmo mais escolarizadas ecom qualidades valorizadas no mercado( habilidade para gestão de pessoas e solução de conflitos, por exemplo), avançamos minimamente em postos de poder nas corporações. Nas empresas privadas, somente 20% do comando é feminino. Poucas chegam ao topo da hierarquia, aos cargos de diretoria e presidência.   70% do salário de um homem na mesma função. É o que ganham as mulheres.


Propostas


•Políticas de incentivo fiscal para empresas que promoverem equiparação salarial e maior representação da mulher nos conselhos administrativos e nos postos de comando.

•Campanha para sugerir mudanças na cultura corporativa,mostrando que contar com as mulheres é fazer boa gestão e bons negócios.

•Ações,em parceria com empresas e instituições de ensino técnico e superior, para qualificar mulheres para funções mais valorizadas no mercado de trabalho, nas áreas da engenharia e da tecnologia da informação, por exemplo.

•Investimentos em pesquisas para traçar um retrato mais nítido e fiel das desigualdades de gênero, raça e etnia.

•Mensuração do peso do trabalho familiar na hora de estimar Produto Interno Bruto (PIB), como forma de dar visibilidade e conferir valor à dupla jornada feminina. •Profissionalização da doméstica,que corresponde a 17% da mão de obra feminina e não tem os mesmos direitos de outras categorias.


Segurança pública


As mulheres são mais vulneráveis,segundo as estatísticas, a assaltos, sequestros, sequestros relâmpagos e ainda sofrem com as ameças que pairam sobre os filhos.No último ano,quase 50 mil crianças estavam na lista de desaparecidos, a maioria vítima de rapto. No Brasil,são assassinados 13 adolescentes,entre 12 e 18 anos, por dia, quase 5 mil em 12 meses. Esses crimes representam 45%das mortes dos jovens nessa faixa. Grande parte dos casos é fruto do casamento entre tráfico de drogas e de armas e a paralisia do Estado. A ameaça atinge todas as classes sociais,embora meninos negros e da periferia sejam os principais alvos. O Índice de Homicídio por Adolescente (IHA),criado para expressar,num universo de mil pessoas,a quantidade de adolescentes que,tendo chegado aos 12 anos, não alcançarão os 19, traz uma revelação assustadora: de 2007 até 2013 serão mortos 33 mil garotos se não houver um sistemático enfrentamento
da violência no país.O IHA,publicado em dezembro de 2010,foi medido em 266 cidades com mais de 100 mil habitantes, e mostra ainda que a morte de jovens cresce até em lugares que há uma década eram pouco associados à violência, como Imperatriz (MA), agora colocada entre as 20 localidades de maior risco para a
juventude. As cidades de fronteira viveram uma explosão: Foz do Iguaçu (PR) tem o mais alto IHA – quase 12 meninos mortos a cada mil habitantes –,seguida de Cariacica (ES), Olinda(PE) e as capitais Recife e Maceió. O estudo é de responsabilidade da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência,do Unicef,do Observatório de Favelas e do Laboratório de Análise da Violência da Uerj.


Propostas


•Ampliação de investimentos em programas de complementação de renda para os setores mais desfavorecidos; programas que aumentem a qualidade da educação e ofereçam oportunidade de futuro para os adolescentes de áreas de risco. Foco nas prioridades da Ação Social Criança e Adolescente.

•Adoção de política de enfrentamento do crime organizado e do tráfico de drogas, de armas e de pessoas, articulando os esforços nas esferas federal, estadual e municipal.

•Criação de um cadastro nacional de crianças desaparecidas.

• Valorização de policiais civis e militares, com melhores salários; apoio à saúde física e mental das tropas; disponibilização de viaturas e equipamentos;treinamento especializado para lidar com o cidadão de forma respeitosa e humana.

•Ênfase no policiamento comunitário e preventivo.

•Ampliação de equipes de inteligência nas polícias.

• Maior fiscalização nas fronteiras brasileiras.

• Campanhas pelo desarmamento.Apreensão de armas de fogo irregulares e clandestinas,uma vez que 90% dos homicídios são cometidos com revólveres e pistolas,quase todos em situação irregular.

•Para diminuir os riscos urbanos:melhor iluminação nas vias públicas, reurbanização de favelas e bairros periféricos nas grandes metrópoles; maior rede de transporte coletivo
 
 
Igualdade em casa


Os estereótipos de gênero ainda ditam as regras em muitas famílias brasileiras.Sobram para as mulheres os cuidados com casa, filhos, animais, idosos e doentes. Elas encontram prazer na relação com aqueles que amam, mas o excesso de atividades da rotina doméstica corrói o tempo que teriam para estudar, reciclarse,divertir-se e destacar-se na profissão,na sociedade,na vida pública. Segundo o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), nos últimos dez anos o percentual de mulheres que contribuem para a renda familiar saltou de 39,1% para 64,3%.As mulheres de dupla jornada representam 87,9%,contra 46,1% dos homens.Mais: elas dedicam 20,9 horas semanais ao universo doméstico,eles gastam apenas 9,2 horas, muitas vezes no que chamam de atividades lúdicas, como lavar o carro e dar banho no cachorro. Não há por parte da sociedade uma compreensão da maternidade como função social e o reconhecimento de que a responsabilidade do homem é a mesma da mulher quanto ao desenvolvimento e à educação dos filhos.E,claro,o funcionamento da casa é de competência do casal.Mas aindapesasobre elaoestigmade cuidadora exclusiva.


Propostas


•Ampliação da rede de creches (só na capital paulista há 125 mil crianças sem creche) e escolas de qualidade em tempo integral, que, além de ser um direitoda criança, é uma alternativa para a mãe ingressar e se manter no mercado.

•Estudos para a criação de uma lei que conceda aos homens o direito à licença-paternidade,com a possibilidade de dividir com a mulher a licença-maternidade expandida.

•Projetos para a criação de serviços de assistência aos idosos e também aos portadores de deficiência.

•Investimentos em educação e em campanhas para mudar a mentalidade da sociedade em relação à figura da mulher como cuidadora exclusiva no âmbito doméstico.


Direitos reprodutivos


A maternidade é uma escolha,não um destino. Temos o direito de decidir o tamanho da família que queremos e de controlar nossa capacidade reprodutiva.No Brasil,cresce a ênfase no planejamento familiar, que reduziu a taxa de fecundidade para 1,8 filho por mulher; o SUS patrocina laqueadura de trompas,
vasectomia, pílulas anticoncepcionais, injetáveis e de emergência e DIU.Mas há entraves.A Lei do Planejamento Familiar (Lei 9 263,de 1996),que resguarda esses direitos,tem sido desrespeitada especialmente no que se refere à esterilização por funcionários públicos e profissionais de saúde,sob a alegação de valores filosóficos ou religiosos. No Estado laico, a conduta é inadmissível. Outro problema grave é o aborto inseguro (praticado anualmente por um milhão de brasileiras),que leva a complicações responsáveis pela segunda maior causa de internação em idade reprodutiva.Segundo o Ministério da Saúde,o aborto ocasiona 15% dos casos de mortalidade materna (a quarta causa de morte feminina). Só em 2009 foram realizadas noSUS 183,6 mil curetagens. A lei que criminaliza o aborto é de 1940 – comparável à legislação de países como Haiti,Paraguai e Afeganistão – e só permite a interrupção em caso de estupro ourisco de morte para a mulher.Mas apenas 138 hospitais públicos,de capitais e grandes cidades,realizam o aborto legal. Na maioria dos municípios, a mulher não conta com apoio do Estado nem nos casos previstos no Código Penal.


Propostas


•Ampliação de programas de educação sexual e reprodutiva, com pleno acesso aos anticoncepcionais e às pílulas de emergência.

•Intensificação de campanhas de orientação a adolescentes, discussões multidisciplinares na escola e nos postos de saúde acerca da autonomia sobre o próprio corpo,da prevenção da gravidez precoce, do uso de preservativos e de doenças sexualmente transmissíveis.

•Ampliação da rede de hospitais públicos que realizem aborto legal em cidades menores e na zona rural;criação de programa preventivo para redução de riscos e danos ocorridos no abortamento clandestino.As medidas diminuiriam as mortes de mulheres.

•Aprovação pelo STF do aborto de anencéfalo.

•Debates sobre a flexibilização da lei que criminaliza o aborto.


Mais mulheres no poder


O eleitorado reconheceu que a mulher é competente para a vida pública – temos parte importante nessa conscientização. Mas as candidaturas femininas para o Legislativo não conseguiram se comunicar com os brasileiros. Embora no primeiro turno os eleitores tenham dado 68 milhões de votos (2/3) às duas mulheres
que disputaram o Palácio do Planalto – derrubando a máxima de que homem não vota em mulher –, o número de eleitas deixou a desejar,se comparado ao pleito anterior.Sagraram-se vitoriosas apenas duas governadoras (em 2006 foram três), 45 deputadas federais, como na legislatura passada, e 12 senadoras contra 11.Sinal de que os partidos,mais uma vez,não estenderam a elas o dinheiro arrecadado para as campanhas – preferiram continuar investindo nas candidaturas masculinas. A minirreforma eleitoral aprovada em 2009 não surtiu efeito:a penas 17% dos partidos cumpriram a determinação de registrar 30% de candidatas.Além disso,elas continuaram aparecendo menos na propaganda eleitoral do rádio e daTV.Mas a força simbólica de uma mulher no poder central, somada às ações e políticas públicas que Dilma Rousseff priorizar,será fundamental para o empoderamento de outras mulheres.Isso pode garantir que, já nas eleições municipais de 2012, quando o voto feminino completará 80 anos,uma quantidade expressiva de brasileiras conquistem mais prefeituras e mais cadeiras nas câmaras municipais.


Propostas


•Reforma eleitoral que inclua punição aos partidos/coligações que descumprirem a regra que prevê o registro de 30% de candidaturas femininas,destinação de 10% do tempo de rádio e TV a elas e 5% da verba partidária para capacitação das mulheres.A reforma deve estabelecer paridade no Parlamento. Em alguns países, são reservadas 30% das cadeiras da Câmara e do Senado para as mulheres – afinal, todos os avanços que as mulheres pretendem dependem de lei. E, no Brasil, quem faz as leis são os homens.

•Incentivo às prefeituras para criação de estruturas (secretarias ou conselhos municipais)dedicadas ao empoderamento da mulher,ao diagnóstico e ao monitoramento dos principais problemas de gênero. Dos 5 565 municípios brasileiros, apenas 1 043 possuem essas estruturas. Nesse tema, o governo federal poderia estabelecer parcerias com organizações,como o Instituto Avon,que já assessora mais de 20 municípios treinando gestores para esse fim.


Abaixo o preconceito


OBrasil é o país que mais consome remédios para emagrecer e ocupa o segundo lugar em realização de cirurgias plásticas. Esse é um sintoma claro de que a busca do corpo perfeito inquieta as mulheres e faz muitas se sentirem diminuídas por não atingirem o padrão das passarelas.A valorização excessiva da beleza física contribui para o aprisionamento da mulher a um só padrão estético e cria um grave problema social que envolve distúrbios de imagem corporal e desencadeia doenças emocionais. Os estereótipos mais reforçados são os de mulher que só se realiza com o casamento e a maternidade; que usa o corpo para obter favores; que se submete ao homem.As negras denunciam que setores da mídia reforçam a imagem de que são mulheres de segunda categoria,para quem não há espaço no trabalho ou no noticiário de assuntos positivos.Ainda pesa no imaginário masculino, principalmente fora do Brasil, que negras e mulatas são mercadorias de exportação.Lideranças indígenas relatam que as índias incorporaram ao longo de séculos a imagem de que mulher apanha calada, aceita o incesto, o assédio e o abuso dos homens da aldeia.Elas sofrem essas agressões,mas não denunciam. E quando deixam sua terra e vão para a área urbana, amargam o estereótipo de incapazes,despreparadas e inferiores.As lésbicas e bissexuais também lutam contra a violência, o desrespeito e as dificuldades que enfrentam numa sociedade que guarda o ranço patriarcal.Por tudo isso,é urgente enfrentar a questão do preconceito e das imagens estereotipadas em relação à condição feminina.


Propostas


•Realização de campanhas em parceria com os meios de comunicação pela cultura da diversidade, desconstruindo a visão machista,sexista,racista e homofóbica.Também cabe estimular a escola e a família a participarem desse processo de mudança de mentalidade em relação ao papel e à imagem das mulheres.

•Os servidores públicos devem ser treinados para atender com dignidade afrodescendentes,moradoras da zona rural,profissionais do sexo, portadoras de necessidades especiais, lésbicas, índias e mulheres das camadas mais vulneráveis.

•Ampliar o debate sobre a união civil de pessoas do mesmo sexo para possibilitar a aprovação do projeto que trata do tema e que está parado no Congresso há mais de uma década.


Por:    Diretora de Redação Cynthia Greiner

Diretora de Arte Cida Junqueira

Redatora-Chefe Sibelle Pedral

Coordenação e Edição Patrícia Zaidan

Reportagem Iracy Paulina

Colaboraram Isabella D’Ercole e Cláudia Bueno Franco

Editora de Arte Marli Miler

Designer Claudia Simone Fukunaga

Revisor Anderson Félix Nunes

CLAUDIA ON-LINE

Editora Claudia Maximino

entre muitas outras colaboradoras (ver no site)

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