sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Mundo rico deve ter estagnação longa, dizem desenvolvimentistas

Os países desenvolvidos devem enfrentar um longo período de estagnação econômica, num cenário em que Estados Unidos e Europa deixam os estímulos fiscais em segundo plano, os salários não acompanham a evolução da produtividade e a política monetária pouco afeta a atividade.
 
Reunidos ontem num seminário na Fundação Getulio Vargas (FGV), economistas desenvolvimentistas traçaram esse diagnóstico para a economia global, considerando mais provável um quadro de vários anos de baixo crescimento do que uma ruptura como a que sucedeu a quebra do Lehman Brothers, em setembro de 2008. A era de preços de commodities nas alturas tende a ficar para trás, afetando o Brasil, grande exportador de produtos primários.

O economista Thomas Palley, do instituto de políticas públicas New America Foundation, vê o cenário de uma longa estagnação nos países desenvolvidos como o cenário mais provável. "No curso dessa estagnação, contudo, haverá mais recessões", afirmou, avaliando que acabou o tempo de recuperações rápidas dos países mais industrializados. Um dos motivos é a separação entre o crescimento dos salários e da produtividade, um fator crucial para estimular a demanda, que deixou de ser uma realidade no mundo desenvolvido a partir dos anos 80, quando, segundo ele, o receituário keynesiano foi abandonado.

O economista-chefe da Agência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad, na sigla em inglês), Heiner Flassbeck, também considera o divórcio entre os salários médios e a produtividade como um fator crucial para explicar a dificuldade do mundo desenvolvido em retomar o crescimento. É o que se passa nos EUA e no Japão, disse ele, destacando que salários em alta são fundamentais para impulsionar a demanda. Como Palley, Flassbeck participou ontem do primeiro dia do seminário "O novo desenvolvimentismo e uma nova macroeconomia do desenvolvimento", organizado pela Escola de Economia de São Paulo da FGV e pelo Centro Celso Furtado.

O economista Ricardo Carneiro, da Unicamp, também aposta num cenário de baixo crescimento por um longo período. Segundo ele, a digestão de uma crise financeira como a de 2008 costuma levar muito tempo para ser digerida, dado a necessidade de se reduzir o endividamento. A recuperação de crises desse tipo, disse Carneiro, é difícil mesmo quando se tomam as decisões corretas, o que não está longe de ocorrer nos EUA e na Europa. Com famílias endividadas e empresas sem investir, o impulso teria que vir do setor público, afirmou ele, mostrando ceticismo quanto a uma retomada do crescimento via exportações, já que essa estratégia não pode favorecer todos os países ao mesmo tempo.

Carneiro tampouco vê grande espaço para a ação da política monetária, com os juros próximos de zero no mundo desenvolvido. Caberia aos governos estimular a economia, caminho que não deve ser trilhado nem pelos EUA e nem pela Europa, pelo contrário.

O professor Luiz Gonzaga Belluzzo, da Unicamp, também vê como imprescindível o uso da política fiscal neste momento, lamentando que o impasse político nos EUA tenha travado essa alternativa. As duas rodadas de afrouxamento quantitativo (a política do banco central americano de comprar títulos públicos e privados) tiveram pouco efeito sobre a demanda, segundo ele. Nesse cenário, o que se pode esperar é crescimento baixo no países ricos.

Esse cenário de estagnação não combina com preços de commodities elevados, o que terá impacto sobre o Brasil. Para Palley, aliás, os brasileiros têm se mostrado otimistas demais. O país, observou ele, depende muito das altas cotações de produtos primários, que devem sofrer num momento em que os países desenvolvidos, ainda 70% da economia global, tendem a ficar estagnados. Além disso, não está claro se a China conseguirá crescer ao ritmo dos últimos anos, já que o país exporta muito para os EUA e para a Europa e há o risco de ocorrer algum problema no sistema bancário chinês.
 

FONTE: Valor Econômico

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